Reportagem: Alvalade Arise (10ª edição) – 23 e 24 de maio de 2025

 



O Festival de Metal em Alvalade do Sado, faz já parte do roteiro de festivais de verão. É um que faço questão de não falhar! E que eu convido fortemente todos os que gostam de música extrema.

O cartaz deste ano mostra um rol bastante abrangente em termos sonoros. Existindo bandas que vão do Punk Rock, passando pelo Hardcore, em direção ao Crossover, e atingindo o Metal mais extremo como o Death. Em suma, estão reunidas as condições para agradar muitos ouvidos, e cativar novos tímpanos curiosos, que ousem pisar a margem sul do Sado.


1º Dia


Against Them All e um Hardcore Energético

A primeira banda do Fest foram os Against Them All. Esta malta tem uma energia que não se esgota! Com um Hardcore com muitos laivos de metal, e numas malhas é possível sentir que estamos em Crossover Town. A sua atitude em palco é simplesmente memorável e irrepreensível, só é mesmo superada pela capacidade de interagir com o público (non-stop. Uma das melhores formas de iniciar um Fest!

Via-se muita gente no recinto logo neste primeiro dia, vaticinando auspiciosamente que esta será uma edição que ficará gravada sobre pedra.

 

Albert Fish e um Punk Rock que nos faz viajar

 Os Albert Fish tomaram de assalto Alvalade do Sado! Música típica do Punk Rock, porém com um gostinho a novo, apesar da banda já cá andar há 30 anos. E com excelentes harmonias, algo não muito habitual neste género (mais uma lufada de ar fresco).

Malhas infundidas com crítica social, e muitas mesmo para reflexão individual e/ou coletiva. E um groove do qual era impossível não dançar! Energia que se disseminava por todo o recinto e arredores. E um vocal sublime, que nos guia pelas orlas frenéticas galvanizadas pelos acordes martelados pelas guitarras incessantes.

Albert Fish buscaram inspiração no nome de um serial killer norte-americano, e na verdade percebe-se o porquê, foram raros os que se mantinham vivos após este concertão! Assassinados, pela energia atmosférica destas bombas atómicas veiculas, pelo Punk Rock! Um dos pontos altos do primeiro dia do Fest. O público manifestou-se, sempre que terminava uma canção, evidenciando o seu encanto pelo conjunto.

 

M.E.D.O. com Hardcore à moda antiga

O colectivo Algarvio sabe como se faz Old School Hardcore, e não têm medo em mostrar ao mundo! Talvez a banda mais vibrante em palco, com uma atitude que se transmitia radialmente, e que tocou no coração de todos os presentes.

Tal era o caldo, que abriu a época do Mosh Pit! M.E.D.O. ainda nos bombardeou com uns Breakdowns que nos partiam a cervical. Os fãs de Hardcore mais clássico ficaram deliciados. Algumas malhas como “50 Pecados Mortais” roçam o Crossover, e no geral há uma aura que nos remete para Rage Against The Machine.

Canções ornamentadas com critica social (nada subtil). Uma lírica carregada de dinamites. Uma atitude típica no género. Em suma, uma cólera pela sociedade, transfigurada em canções que nos tocam e nos fazem refletir (enquanto nos mantemos em Headbanging colectivo).

 

Mata-Ratos um clássico que não se esgota

 Se há uma banda que é querida por tudo o que é fãs de rock, punk e metal (e todas as suas ramificações) – são os Mata-Ratos.

O momento em que finalmente houve um mosh pit brindado com muita cerveja (e não, não só durante a malha “Tsunami de Cerveja”). Muita felicidade por todo o recinto. Foi aqui que os festivaleiros mostraram que tinham vindo para festejar!

Os clássicos como “Raça Humana” e “CCM” não faltaram! O público que se encontrava junto das grades, acabou por cantar várias das malhas juntamente com a banda, numa espécie de dueto (típico nos concertos de Mata-Ratos).

Punk Rock clássico que tem um lugar na história da música nacional, e que abriu caminho para muitas bandas posteriores. É difícil encontrar alguém que não goste da energia dos Mata-Ratos. E os que não conhecem, pois bem ficam rapidamente devotos.

É mais um dos pontos altos do primeiro dia do Fest.

 

Dalai Lume o Punk de Alvalade

Troca de última hora, os Dalai Lume vieram substituir os Cavilha. Realizando assim a sua estreia no Fest.

O conjunto representa o Hardcore de Alvalade (Alvalade de Lisboa, não confundir com Alvalade do Sado). A sua sonoridade fica mais centrada no Punk Rock Clássico (na minha modesta opinião).

Umas malhas que nos entram facilmente pelos tímpanos, e que de alguma forma nos soam a familiar. Senti uma viagem à adolescência, dos tempos em que ouvia mais regularmente este género de música. Foi como que uma viagem nostálgica. E penso que este sentimento foi transversal a muitos dos presentes.

Uma excelente forma de encerrar o dia 1 do festival, deixando um gostinho na boca. E abrindo ainda mais a vontade para o dia 2.

 

2º Dia


Problemas logísticos da minha parte, não me permitiu assistir ao concerto dos Liber Mortis. E faço desde já o meu pedido de desculpas à banda. Porém, tenho a convicção de que deram um alto show, certamente.


Black Widows a gelar o calor do Alentejo

Metal Gótico tem sempre o seu encanto. Traz sempre consigo aquela tensão gélida que nos arrefece por fora, mas nos aquece no interior. As Black Widows fizeram isso mesmo, muito habilmente.

Com uma energia interminável e uma constante comunicação com a plateia, mantendo uma conexão de pureza, que só se vê na comunidade metaleira.

Aquele teclado é uma lufada de ar fresco (sublime diga-se de passagem), e as mudanças rítmicas existentes nas malhas são de destacar. A brutalidade da voz é também qualquer coisa de fantástico, que se alterna sucessivamente na já habitual dualidade de Bela e Monstro (típico do género), feito por apenas uma pessoa. Resumidamente, do melhor Gótico que se faz cá na Tuga.

 

Spitgod e a conquista total de Alvalade

Spitgod arrasaram por completo! Com um Blackened Thrash brutalíssimo não ouve nenhum tímpano por conquistar! Uma energia fora de série e uma atitude fora do comum.

A dupla evidenciou uma simbiose maravilhosa, e a sua prestação foi um dos pontos altos do festival. Com uma sonoridade que se centra numa mistura entre o Black e o Thrash, com uns laivos de Rock’n’Roll e um certo aroma Crust Punk – remete para aqueles 4 álbuns dos Darkthrone, onde há uma mistura com Crust Punk. Pinch harmonics que nos pregam ao chão, que vêm acompanhados por um groove na bateria que nos fazem querer que este gig nunca termine. Quando isso não acontece, somos hipnotizados por uns tremolos vibrantes, enfeitados por uns brutos blast beats. Em algumas malhas há vestígios de Death, em particular nas intro atmosféricas, e na minha cabeça vêm logo o nome de Bolt Thrower.

A temperatura subiu ao ponto de ebulição, catalisando-se num Mosh Pit – o público está em êxtase. As alternâncias rítmicas são bem recebidas providenciando um extra groove carregado de power. A loucura toma de assalto Alvalade, e os Spitgod como bons agentes do CAOS que são, atiram ainda mais gasolina para fogueira. O resultado: Crowd Surfing inesperado, surpreendendo todos os presentes.

Spitgod deixaram muito bem vincada a sua prestação, e os presentes ficaram a falar do seu concerto durante o resto do dia. Querem-se mais prestações como esta. Entrega total à sua arte. Numa palavra: perfeito.

 

Okkultist e o puro Death Metal

Okkultist tiveram uma prestação irrepreensível. A banda atacou o palco com tudo o que tinha para dar, e pediu sempre mais ao público. A voz está no ponto, e cativa facilmente qualquer fã do género. Queria destacar a bateria, que apresentou uma excelente dinâmica, e vai para além da bateria standard do Death Metal.

Destaque para o tema “Meet me in Hell” que foi single, e o “Death to your Breed” (que já agora tem um videoclipe top).

Contudo, o ponto alto da prestação é sem sombra de dúvida, a cover do Children of Bodom “Sixpounder”, que trouxe (pelo menos para mim) um comboio de sentimentos e de muita nostalgia.

No entanto, esperava-se mais do público. Talvez o calor tenha inibido alguns dos presentes, que preferiram abanar a cabeça comodamente.

 

Equaleft: o que é que foi isto?

A banda que me deixou rendido em apenas 10 segundos. Eu não estava preparado para isto…

Equaleft lançaram um Groove Metal que não é deste mundo! Com uma execução impecável e invejável.

A sonoridade foi a mais rica de todo o Fest. Digo isto porque esta não é a banda típica de Groove. Há ali intrusões de Mathcore (eu juro que senti Dilinger Escape Plan ali algures, numas alternâncias rítmicas caóticas), vislumbres de Death (com tremolos e blast beats) e uns riffs de puro Thrash. Ahh e não esquecendo as guitarras modernas sem headstock (e com 7 ou 8 cordas, que eu de onde estava não consegui contar), deixando a sugestão de algo mais progressivo… as minhas preces foram acudidas e senti um Djent nada subtil em riffs Super Chug, a relembrar Meshuggah. Provando, música atrás de música, que eles não são nenhuma cópia de Lamb of God, são si uma banda com uma identidade muito própria, e nada delimitada por géneros.

A cervical de todos no recinto, deverá ficar ressentida nas próximas semanas, pois era impossível não entrar na vibe de Headbanging perpétuo, descontroladamente. O groove era tanto, tão epidémico e tão incrível que enfim… se não era isso eram os breakdowns de partir a espinha (ou o que restava dela).

Pena não termos visto o baixo ao vivo. Ficará para uma próxima.

A interação com o público esteve sempre lá entre músicas (e durante).

Equaleft partiu-me a cabeça e conquistou-me o coração. Que brutalidade foi esta?

 

Simbiose é um clássico inesgotável

 Simbiose dispensa de apresentações. A banda é já há muito, um ícone do panorama nacional (e internacional).

A sonoridade é um misto de Crust com Grindcore, e tem lá pelo meio algumas vertentes de metal como o Death.

A energia e entrega da banda não tem comparação. São muitos anos a virar frangos, e a experiência conta muito. A plateia em rebuliço mostrava que queria mais. A banda trouxe um setlist que se vinha carregado de boas malhas, tanto novas como temas mais clássicos.

As malhas todas elas vinham carregadas (ênfase no carregadas) de critica social. A vibe estava ao rubro, e este era verdadeiramente o melhor aquecimento possível para Ratos de Porão.

 

Viv’Afolia: uma surpresa interessante

Trata-se de um grupo de percussão formado por jovens oriundos de Alvalade do Sado.

Tambores e muito ritmo, criaram uma atmosfera quase tribal, que desencadeia algo de primitivo no interior do ser humano. Aliado a violino e as duas guitarras (Mariana e Ricardo dos Dercetius) para tornar a aura sonora um pouco mais pesada.

Acabou por servir como uma breve pausa para o que vinha a seguir. Foi sem dúvida uma grande surpresa da noite, e muito bem recebida.

 

Ratos de Porão e a loucura em Alvalade

A razão do êxodo a Alvalade do Sado estava aqui: Ratos de Porão! Este é o único concerto na Península Ibérica, em 2025, da banda de São de Paulo. É o feito importantíssimo para o Festival e todos os festivaleiros.

Sobre a atuação, pois bem, eu não disponho de léxico suficiente para realizar uma descrição digna daquilo que se passou… todavia irei tentar. Imaginem CAOS, misturado com confusão, desordem e ainda mais CAOS, tudo isso agora em esteróides. Confusão e muito Mosh Pit, sem parar… A felicidade ia escorrendo pelas caras dos presentes, cada malha que passava era como se aumentassem a intensidade das emoções vividas.

As malhas clássicas, de uma das mais importantes bandas de Hardcore e Crossover do mundo, recheadas de critica social, e tantas tão atuais (infelizmente).

Levo no meu coração o momento em que o coletivo do Brasil tocou “Beber até Morrer”, que é o clássico dos clássicos. Perdi a conta ao número de presentes no recinto... nunca vi tanta gente no Alvalade Arise. Sorrisos a granel, felicidade que percolava entre todos, e nos novos dicionários virá certamente este momento para exemplificar a palavra alegria.

 

Yaatana com o seu Crossover demiúrgico

 Yaatana teve a tarefa hercúlea de ressuscitar as almas perdidas em Ratos de Porão. E conseguiram-no de forma muito engenhosa.

Este quarteto do Porto, apesar de jovem, mostrou uma presença de palco de quem parece já fazer isto há décadas. Muito comunicativos, e sempre dispostos a tocar “só mais uma”. Eu perdi a conta ao número de encores que fizeram, mas todos foram recebidos como se fosse mesmo a última.

A sua sonoridade faz muito lembrar bandas como Municipal Waste ou mesmo Power Trip. Thrash intervalado com Hardcore, com pé sempre a fundo no acelerador (e sem travões).

Uma banda com muito para dar, e sem vergonha de o dizer e de o mostrar. Pena foi mesmo muitos terem abandonado o recinto, e não puderam testemunhar a banda com mais vontade de mostrar a sua arte (esses é que perdem).

Uma banda para ter em atenção nos próximos tempos, pois talento e vontade não lhes falta.

 

Freitas e os clássicos do Metal

Digo isto, e repito as vezes que forem necessárias. António Freitas é a melhor forma de encerrar Festivais! Com ele podemos sempre contar para ouvir temas épicos, clássicos e nostálgicos. Há no set de António Freitas, pelo menos uma música para cada um de nós.

Infelizmente, não pude ficar até ao final, no entanto enquanto lá estive deu para me deliciar com Metallica, Slayer, Megadeth, Lamb of God, PANTERA!!!, Hatebreed e Slipknot.

A sua última passagem tinha sido em 2023, e pode-se afirmar que foi um grande regresso!


Eu já me rendi a este festival, desde 2023. O ano de 2024 foi o retornar e ter a certeza que este é o festival do Alentejo Litoral. Este ano, pois bem, foi um ano quase sem palavras. Saio de Alvalade com o coração cheio e com os tímpanos a precisar de recobro.

Muita música da pesada e da boa. Para os fãs de Punk, Hardcore e Metal (nas suas diversas variantes).

Tenho de deixar isto escrito, para mim as melhores bandas do festival foram os Equaleft e os Spitgod. Foram aquelas bandas que acenderam aquela chama que, acredito que todos tenhamos. Foram aquelas que me arrancaram um sorriso na cara, assim que começaram a tocar. Anseio pelos próximos gigs. Muitos parabéns malta!

São 10 anos de Alvalade Arise, e esta foi a melhor forma de celebrar uma década de história. Fez-se história no Alvalde Arise! Fez-se história em Alvalade do Sado! Fez-se história no Alentejo! Fez-se história em Portugal!

Aproveito para ressalvar que, a criação de uma zona de refeições foi feita de forma muito inteligente! Abrindo mais espaço no recinto para quem quisesse assistir aos concertos. E criando uma certa privacidade para quem quisesse comer. Muito bem conseguido!

Deixo a minha palavra de agradecimento à organização, porque montar um festival não é mesmo nada fácil. E trazer bandas do estrangeiro, torna sempre a tarefa um pouco mais complexa. Tudo correu como previsto, e como festivaleiro só tenho mesmo de agradecer, porque tudo estava impecável. Aproveito para agradecer às bandas, por migrarem até ao Alentejo (em dias de extremo calor), e ainda entregar a sua arte, de uma forma tão exemplar. E agradecer a todos os que de alguma forma estiveram envolvidos no festival. Agradecer aos fotógrafos e a todas formas de press, pois são eles que permitem que este festival chegue a mais pessoas.

Por fim, mas não menos importante, um grande obrigado ao meu amigo Bruno Rosa. Pelo convite, pela amabilidade e hospitalidade. Estás de parabéns (e todos os outros que de alguma forma tornaram possível o festival). Venham daí pelo menos mais 10 edições! Um forte abraço!

Fica a sugestão de colocar em bom som o "Arise" dos Sepultura no abrir e fechar do Festival, acho que ficaria engraçado eheh.

Se tiverem curiosidade vejam aqui o texto sobre a edição de2023. E deixo também o texto sobre a edição de 2024.


Eu só peço mais eventos como este! Momentos de descontração através da arte mais bonita do mundo: A música! Querem-se mais festivais como este! Quere-se boa música, bom ambiente e bons festivaleiros! Como eu disse no ano passado, resta dizer: que venha o Alvalade Arise 2026! (eu estarei lá certamente, e tu? Vais ficar de fora deste Fest?)


É isto que é metal! É isto que é O Peso do Metal!


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