Reportagem Dread Reaver Europe Tour 2024 (Abbath + Toxic Holocaust + Hellripper) – RCA Club, Lisboa [13 de Janeiro de 2024]

A tour do Abbath chegou finalmente a Portugal, sob uma dose dupla partilhada entre a capital e a cidade do Porto. Quem assistiu ontem ao concerto no RCA não pode ficar indiferente certamente, pois há várias formas de abrir um ano novo de concertos, mas a forma como foi dado o primeiro passo na noite passada profetiza um dos melhores anos de sempre, no nosso país.

Já se assistiu a muitos gigs no RCA, de diversos géneros e em diversas alturas do ano, mas arrisco-me a dizer que nunca se sentiu um ambiente tão quente e potente como o da noite passada. A título de exemplo, não me lembro da última vez em que foram colocados seguranças no palco para “acalmarem” o caótico crowd surfing que se fazia por toda a sala, durante todo o show, de todas as bandas.


A banda que abriu as hostilidades foram os Hellripper, diretamente da Escócia vieram a Portugal, nesta sua estreia, espalhar o seu Black’N’Roll por toda a sala e arredores. A sonoridade da banda é uma mistura perfeita entre o Black e o Speed, com uns solos de guitarra iluminados com os pés bem vincados naquilo que se fazia no Thrash no ínicio dos anos 80 ou em qualquer solo de bandas do NWOBHM. Em suma pegam em Motorhead e Venom, misturam com Darkthrone, dão-lhe e uma bela dose de shredding a la Megadeth et voilá: o melhor som possível para se dançar num concerto. E dançar foi aquilo que se fez na sala de Alvalade desde o primeiro acorde do primeiro riff do primeiro tema “Vampire’s Grave”.

A sala em conjunto, como se de um ser vivo com consciência coletiva se tratasse, reuniu-se num festival de crowd surfing e mega mosh pit, que só abrandava por breves pausas, para os artistas em palco conseguirem iniciar um novo tema. Foi caos? Foi, mas foi um caos sublime, daquele que nos dá vontade de repetir, e de fazer tudo igual, sem mudar nada, apenas repetir para que o nosso córtex possa processar com maior detalhe e rigor as memórias vividas naqueles fugazes momentos.

O segundo tema encapsula tudo o que é Hellripper “Hell’s Rock’N’Roll”, caso não conheçam o tema, nem a banda recomendo vivamente que oiçam esta malha, e garanto-vos que vão ficar agarrados ao som. Serão transportados numa máquina do tempo para uns anos 60 onde o Rock’N’Roll era alei, mas o vocal e a aura tem os seus alicerces no Black e Speed Metal, enfim vão ouvir e não se irão arrepender. Destacar ainda temas como “Bastard of Hades” onde quem não ouvir nas entrelinhas a “Hit the Lights” dos Metallica é porque não é um verdadeiro fã de Thrash Metal; e claro o tema icónico “All Hail the Goat” que pôs todo o RCA, repito, todo o RCA a cantar o incrível refrão, refrão esse, que arrepia só de relembrar enquanto escrevo estas palavras; e encerraram com o tema “Headless Angels”


Os Toxic Holocaust já não são novos nestas andanças, muito menos em Portugal, e a sua legião de fãs presentes no RCA vei atestar isso mesmo. Espalharam com sucesso o seu Thrash Metal tóxico por toda a sala, só que os metaleiros de Alvalade se mostraram imunes a esse veneno, pelo contrário mostraram uma vivacidade nunca demostrada num concerto. Foram mosh pits incessantes com muito crowdsurfing, que levou a que os seguranças do RCA tivessem de ficar nos cantos do palco, para impedirem que a loucura fluísse da plateia para o palco, veiculada na metade da multidão que surfava a outra metade.

Os riffs enérgicos da banda foram a faísca mais do que necessária para reacender o fogo e deixá-lo a arder de forma frenética durante os 11 temas tocados de forma bastante vertiginosa e apelativa. “Acid Fuzz” por exemplo invocou a loucura interna de cada um de nós, que se materializou no plano físico sobre a forma de circle pit e headbanging, com muita (ênfase no muita) cerveja a voar pelos presentes; até os que quiserem ficar pela varanda do RCA não conseguiram ficar indiferentes à energia nuclear emitida pelos 3 reatores artísticos presentes no palco. A sonoridade da banda é um Thrash Metal com intrusões de Black que lhe condicionam uma tonalidade mais sombria, mas que se coaduna na perfeição.

Temas emblemáticos que nos fazem gritar por mais como “Wild Dogs”, onde todos no RCA foram elogiados pelo próprio Joel Grind como sendo uns verdadeiros Wild Dogs;  “Nuke the Cross” onde todo o poder da banda é canalizado para aquele riff poderoso que é temperado por uma bateria incansável, que por sua vez é elevada pela letras fortes cantadas a um jeito que só a banda consegue entregar de forma eximia; e fechar a noite com “The Lord of the Wasteland” um tema pós-apocalíptico que no fundo congrega a essência temática de muitas das faixas banda.


Tempo de Abbath, e ficou claro que o perfil sociológico de quem veio ver Abbath era ligeiramente diferente do perfil de fãs para as bandas anteriores. Abbath arruinou as contas daqueles que tinham pensado que o setlist iria ser o mesmo das últimas noites (tal como eu), só que foi melhor ainda. “Hecate”, “Acid Haze” e “Dream Cull” para abrir o set, e aqui os fãs dos temas a solo de Abbath vibraram. Os fãs do ‘antigamente’ iriam ter a sua dose com temas de Immortal como “The Rise of Darkness”, “In my Kingdom Cold” e “Beyond the North Waves”, e um tema dos I “Warriors”. Abbath sempre bastante bem disposto fez 'os seus passos habituais de carangueijo', amplamente bem recebido pelos fãs das primeiras filas, que conseguiram, inexplicavelmente, ficar impermeáveis ao mosh pit que circulava ferozmente atrás de si.

Um pequeno problema de som quase no final do tema “The Artifex”, que levou a que banda continuasse a tocar durante uns 30 segundos sem se aperceber que o resto da sala não os estava a ouvir. Foi resolvido num ápice, e recebido com o bom humor típico do Abbath. Para compensar a banda entregou aquilo que muitos esperavam (eu incluído) o mítico tema dos Immortal “One By One”, e se casa não tinha ido abaixo até aqui, pois bem, foi aqui que foi abaixo e voltou a erguer-se sobre tremolos gélidos da Noruega, que nos aquecem a alma, e os blast beats perfurantes, que nos blindam os tímpanos.

Terminam a noite com dois temas robustos “Winter Bane” com o seu riff que apela a tudo o que é Black Metal, mas inundado por uma notas riquíssimas de melodia, que nos fazem querer abraçar as notas da canção; e “Endless” tema do primeiro álbum a solo, e que como o nome indica vem carregado de simbolismo, de recomeço e sem fim, no fundo a mensagem de que Abbath viverá para sempre na música, e quis deixar isso bem vincado na noite incrível do RCA. Foi tempo de músicas mais atuais, mas foi também momento para reviviver os temas paradigmáticos e intemporais dos Immortal.


As 3 bandas trouxeram uma noite que foi no mínimo brutal, para muita dança (mosh) e muita cerveja projetada, porém na minha opinião o verdadeiro protagonista da noite fica para os Hellripper. Eles criaram o mote para a noite, e entregaram-se com uma vontade de deixar os fãs deliciados, e conquistar aqueles que ainda não tinham demonstrado a sua veneração à cabra (All Hail the Goat).

Não sei o que se espera hoje no Porto, mas se for no mínimo como foi em Lisboa, preparem-se porque essas energias vão ser drenadas, e no final da noite vão sair a pensar: “ainda bem que resolvi ir ver estas 3 bandas”. E os seguranças do Hard Club que se preparem, porque vai haver muito (ênfase no muito) crowd surfing!

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